Senador afirma que presença do pai nas eleições de 2026 seria suficiente para encerrar crise diplomática com os Estados Unidos, em meio a tarifas e tensões institucionais.

A crise diplomática entre Brasil e Estados Unidos ganhou um novo capítulo após declarações incisivas do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) à CNN Brasil, no dia 25 de julho. Em tom confiante, o filho do ex-presidente Jair Bolsonaro sugeriu que a simples candidatura do pai nas eleições de 2026 seria capaz de solucionar as tensões com Washington — especialmente após o anúncio de tarifas de até 50% sobre produtos brasileiros, promovido pelo ex-presidente Donald Trump.
“Se fizermos o dever de casa, essa sanção acaba no mesmo dia. Com Jair Bolsonaro nas urnas, não vão mais nos tratar como se fôssemos a Venezuela”, declarou Flávio.
A fala chamou atenção por indicar que, na visão do senador, a política externa brasileira estaria diretamente condicionada à presença de seu pai no processo eleitoral — mesmo que Jair Bolsonaro esteja, atualmente, inelegível por decisão do TSE.
A crise com os EUA: tarifas e retaliação simbólica
A crise atual se agravou após o governo Trump anunciar, em carta dirigida ao Brasil, novas tarifas de importação sobre produtos brasileiros, elevando a taxa para 50%. A justificativa oficial é econômica, mas analistas políticos indicam motivações ideológicas e estratégicas, ligadas ao afastamento entre os governos Lula e Trump.
Segundo Flávio, essa penalização econômica seria também uma resposta direta ao julgamento e condenação de Jair Bolsonaro pelo STF e TSE, que, segundo ele, transformaram o ex-presidente em vítima de perseguição política. Na carta enviada ao Planalto, Trump teria classificado a decisão do Supremo brasileiro como uma “vergonha internacional” — declaração ainda não confirmada oficialmente, mas amplamente repercutida por bolsonaristas.
Críticas ao governo Lula
Durante a entrevista, Flávio Bolsonaro acusou o governo Lula de omissão e até de incentivo às tarifas impostas pelos EUA:
“Não estou feliz com essa tarifa de 50%, não quero que ela vire 100%, mas o que vejo é o Lula fazendo força para que isso aconteça”, afirmou o senador.
A declaração é mais uma evidência do acirramento do clima político interno, com a oposição culpando diretamente o Planalto pelos impactos econômicos internacionais. Ao mesmo tempo, especialistas alertam para o risco de uso político-eleitoral das relações exteriores, algo que pode comprometer a imagem do Brasil no cenário global.
Inelegibilidade de Jair Bolsonaro: o obstáculo ignorado
O discurso de Flávio ignora, propositalmente ou não, o impedimento jurídico que pesa sobre Jair Bolsonaro, declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral em duas ações distintas:
- Reunião com embaixadores (julho de 2022): considerada abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, ao atacar o sistema eleitoral sem apresentar provas.
- Comemorações do Bicentenário da Independência (setembro de 2022): configuraram uso indevido da máquina pública para promoção pessoal durante o período eleitoral.
Ambas as decisões tornaram Bolsonaro inelegível até 2030, o que, na prática, inviabilizaria sua candidatura em 2026 — salvo uma eventual reversão judicial ou aprovação de anistia pelo Congresso, medida considerada controversa e de alto custo político.
A defesa do pai e a retórica da injustiça
Ainda na entrevista, Flávio Bolsonaro classificou as decisões do TSE como “esdrúxulas” e reafirmou que Jair Bolsonaro tem o direito de se sentir perseguido:
“Ele está inelegível por duas questões esdrúxulas. Isso não é justiça, é perseguição. É por isso que a imagem do Brasil está sendo arranhada lá fora.”
Esse tipo de discurso encontra eco entre a base bolsonarista, que ainda considera Bolsonaro uma figura central para a política brasileira. No entanto, juristas alertam para os riscos à institucionalidade quando decisões judiciais passam a ser questionadas apenas sob critérios políticos.
A geopolítica da polarização
A declaração de Flávio Bolsonaro escancara como a política externa brasileira tem sido afetada por disputas internas. Ao vincular as tarifas americanas à ausência de Jair Bolsonaro no cenário eleitoral, o senador sinaliza que a diplomacia está sendo condicionada à política doméstica — um movimento perigoso, segundo analistas, que pode isolar o Brasil em negociações comerciais multilaterais.
Além disso, a crise com os EUA é mais uma peça no xadrez da polarização política global. De um lado, o atual governo Lula busca reconstruir pontes com Europa e Ásia; de outro, os bolsonaristas apostam na retomada de alianças com figuras como Trump, Netanyahu e Orbán, compondo um bloco conservador internacional.
Além da crise entre Brasil e EUA
A entrevista de Flávio Bolsonaro à CNN evidencia não apenas a crise entre Brasil e Estados Unidos, mas também a fragilidade institucional causada pela polarização extrema. Ao sugerir que a resolução de uma crise diplomática depende da presença de Jair Bolsonaro nas urnas, o senador abre um perigoso precedente que mistura política externa com interesses eleitorais pessoais.
Com Jair Bolsonaro legalmente impedido de concorrer, resta saber se a oposição insistirá em sua candidatura como bandeira de campanha ou buscará alternativas viáveis dentro do campo conservador. O que é certo é que a eleição de 2026 já começou — e promete ser, mais uma vez, uma disputa acirrada entre narrativas de “salvação” e acusações de “perseguição”.